quinta-feira, 5 de agosto de 2010

APROVA ou REPROVA — Avaliação sob julgamento

Prof. Roney Signorini – Consultor Educacional
roneysignorini@ig.com.br

Inicia-se um novo semestre letivo. Estarão nas salas de aula os rematriculados e os novos ingressantes dos seletivos. Os primeiros talvez tenham sido promovidos com aprovação total no semestre anterior ou carreguem alguma(s) dependência(s). Os segundos, muitos com mínima qualificação e capacitação para a carreira universitária, mesmo assim lograram ingresso. Outros deles atravessaram o vestíbulo da universidade carregando aprovações automáticas da educação básica. (Aliás, o candidato ao governo de São Paulo Aloísio Mercadante tem posição firmada, declarando que acabará com a aprovação automática nas escolas paulistas, se for eleito, mas não promoverá uma política de repetência dos estudantes da rede pública.)

Ambos os alunos (rematriculados e ingressantes) se sujeitaram a provas para a continuidade dos estudos. Mas, suas avaliações terão ocorrido com eficácia ou as aprovações decorreram de muita tolerância avaliativa, prevalecendo outros interesses do avaliador?

O que está subjacente à avaliação do educando na escola é o conhecimento disponibilizado pelo educador, portanto, ela se impõe aos dois. É essa constatação que explica o medo instalado hoje nas salas de aula em dias de provas/exames, aterrorizando docente e discente e levando à indagação: para que o conhecimento se ele não é testado e avaliado? Qual a validade do teórico se não é posto em prática? Dúvida de ambos. O primeiro quer testar e o segundo quer a nota.

A inexorabilidade da substituição, do upgrade do conhecimento – do que até neste minuto era atual e ficou obsoleto – mostra que os ciclos tecnológicos com respectivas rupturas são apavorantes. Imagine-se o conhecimento obtido no início de um curso e que, ao final dele, não terá a menor importância e valor porque ficou velho.

Assim será (ou já é?) a sociedade do conhecimento, que interioriza a sociedade avaliativa – ou valoradora, ou avaliadora – sem distinguir, com efeito, onde começa a informação e onde termina o conhecimento. E se uma ou outro leva ao saber, evitando-se a chamada “indústria da cultura inútil”.

Eis uma situação típica de imbricação do conhecimento/informação, quando o conhecimento passa a ser o maior, o único tesouro e principal bem de consumo, conforme Peter Drucker (o guru do marketing), para quem é imperativa a necessidade de mantê-lo permanentemente atualizado. Mas, se a informação leva ao conhecimento e se transforma em saber, que se consolida e estratifica pela sua validação/constatação utilitária e consumerista, que papel tem aquele que aprova, avalia, dá certificação e validade ao conhecimento? O próprio detentor do conhecimento, na sua utilização ou não, assim como o avaliador que imprime o seu passed e o utilizador final (sociedade) são os degustadores desse produto e, portanto, também responsáveis por sua aprovação.

Se a sociedade está disposta a abrir mão de qualidade garantida, em qualquer campo da atividade humana, avalizada/avaliada, é direito próprio, mas não do avaliador. A tarefa responsável, portanto, está antes no avaliador, no agente do processo que visará como fim aos resultados.

Então, o que é possível verificar sobre avaliação educacional, estabelecendo uma diagnose nos processos cognitivos dos estudantes, na avaliação do aprendizado?

Até pouco tempo, um Plano de Ensino de disciplina era elaborado visando integrar um currículo de curso com algumas premissas: ementa, objetivos, conteúdos programáticos, metodologia, avaliação e bibliografias (básica e complementar). Tudo permeado com trans e interdisciplinaridades. Em algumas instituições, inclusive o Plano de Aulas.

Com algumas discussões na "semana de planejamento pedagógico", sempre antes do início do ano letivo, consideravam-se o público-alvo, o mercado de trabalho, as mudanças e alterações do cenário sociopolítico e econômico, etc. Com o surgimento das Novas Diretrizes Curriculares, cujo propósito é contemplar o entorno das disciplinas ou ir além delas, com o estabelecimento de competências e habilidades sob impregnância no educando, a tarefa de avaliar o nível e grau de aquisição de conhecimentos dele tornou-se perigosa. Deixa o professor/avaliador em duas situações bastante incômodas: a de refém ou de cúmplice do aluno nessa avaliação. Mas a avaliação responsável e isenta do avaliador, com ele próprio, com o aluno e com a sociedade, não permite dúvidas e fragilidades.

Avaliação equivocada ocorre porque o conhecimento proposto era um equívoco, de forma e conteúdo, e suspeito é o avaliador que se coloca ambiguamente, ao desdém do que deve(ia) ser ensinado, porque precisa ser aprendido. Não é mais possível o uso do velho clichê "o aluno será capaz de..." e completar a frase com qualquer verbo no infinitivo. Pode ser o coração, mas não é a alma do que deve estar contido nos objetivos e justificativa da disciplina.

Sabendo que o ensino e o aprendizado devem ser conduzidos para estimular, provocar no educando uma consciência de construção, interatividade e crítica, visando descobrir e mergulhar em habilidades e competências pessoais, conduzindo a alguma capacitação, o educador sempre levará em conta os resultados impostos e a se obter do processo, ou nas palavras de T. Kellaghan, “a busca por resultados responsáveis”. Cresce significativamente tal responsabilidade na medida em que os currículos mínimos e plenos deixaram de ser a sustentação basilar na formação profissional do aluno. Há muito mais situações e acontecimentos sendo aplicados no ensino atual, impensáveis há dez anos.

Aplicação, essa é a palavra do momento no ensino, aliás, a volta dela. A agenda reformista da educação é sempre dominada pelos modismos, por algum tempo. É preciso, a qualquer custo, ampliar o potencial de uso e aperfeiçoamento das capacidades de avaliação dos professores com relação aos alunos. Nisso reside, no mínimo, o acerto da escolha. Não deve ser a busca da aprovação na “coitadice” nem a reprovação na “vitimez” do avaliado.

O emprego adequado de um "molde de avaliação" , sem extremos e exageros, torna-se um facilitador nessa tarefa tão difícil. Afora poder colocar em sacrifício absoluto o futuro de um jovem, sobretudo o que está em desencanto com o ambiente atual e dele foge, se rebela e se angustia pela aparente falta de perspectivas socioprofissionais.

Essa moldura, entretanto, não é fórmula, padrão ou gabarito estabelecido. É antes um método pessoal, pelas singularidades do avaliador e do avaliado. Deve-se caracterizar como ato de neutralidade, sem a rixa ou acidez inquisitória. Não deve mostrar-se como esgrima rancorosa, desafiadora de quem, não obtendo resposta satisfatória, desabafe "...eu sabia que você não sabia" ou "...tinha certeza de que você não responderia".

As habilidades e competências podem dar sinais indicativos apropriados na elaboração de um momento de avaliação. Por consequência, na construção de uma vida profissional mais realizada. Adequada às aspirações pessoais, grandes ou pequenas porém autênticas.

Desse modo, aqueles objetivos da disciplina têm de ser repensados, refeitos para outras realidades e dimensões: a das competências e habilidades, fulcro do ENADE.

Não é tarefa simples para quem não está inserido nos mercados e desconhece perfis. Só por esse aspecto, hoje, o PDI ganha importância fundamental na montagem de um curso, e deve estar sob a batuta de um competente coordenador.

A juventude atual tem forte razão para a recusa em ser avaliada, de fora para dentro, à moda antiga. É simples, certo ou errado, possível ou não. O jovem admite ser avaliado, porém, de dentro para fora. Não admite ser questionado pelo avaliador sobre o que ele não sabe, mas deveria saber, e o avaliador insiste em saber o que ele não sabe. Será que o avaliador não sabe que não adianta querer saber o que o avaliado não sabe? A questão central é por que o aluno não sabe? Por incrível, a resposta todos sabemos.

Nenhum comentário: