quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Apontamentos sobre o Ensino Superior e Puxãozinho de Orelha



Prof. Roney Signorini
Assessor e Consultor Educacional
roney.signorini@superig.com.br

Sugestões de títulos e leads para a grande mídia produzir matérias:

(1) O estrabismo federal no setor educacional
Não restam mais dúvidas que a cura definitiva e eficiente do estrabismo só
é possível com cirurgia. Para o caso do ensino superior não é uma reforma mas correção de músculos e rotas dos nervos.
 (2) Ou se é parte do problema ou parte da solução
Solução implica comprometimento sem ignorar os problemas seculares e já é hora
de abandonar as “tentativas”, seja com ações, seja com pessoas.
 (3) E os espartanos no conflito entre gregos e troianos ?
O ensino privado, por definitivo, não entrou na história da educação nacional
como o cavalo de Tróia. Ao contrário, busca sua identidade espartanamente e
só precisa de liberdade, própria da iniciativa particular.
 (4) Balança de um prato só
Há duas balanças primitivas: a de dois pratos e a de um prato só com um
contrapeso para medir. Na primeira os dois pratos sustentam eqüidistantes o
ensino público e privado mas na segunda parece que só está o público.
 (5) Ensino privado, o fiel da balança entre a diferença e a semelhança
Na balança de dois pratos o ponteiro, como fiel, sempre aponta para o lado
inverso do mais leve e é isso que está a indicar, há anos, a tendência do governo
na condução do setor educacional superior.
 (6) Não basta ver, é preciso enxergar
Seria uma figura de linguagem, a representar a deficiência de percepção visual
que o ensino superior privado precisa ser o único responsável pela educação de
massa ? E que essa não é a tarefa do ensino público ?
 Alguns importantes momentos históricos da educação brasileira
Em 1549 ( 29 de março ) chegaram ao Brasil os primeiros educadores. Eram da Companhia de Jesus*, liderados por Manuel da Nóbrega, junto com o 1º governador geral, Tomé de Souza.Em 1553 chega o padre José de Anchieta com a expedição de Duarte da Costa.Em 1759 o Marquês de Pombal   expulsou todos os jesuítas. Ficaram os beneditinos, franciscanos e carmelitas.
Em 1890, pela reforma de Benjamin Constant Botelho de Magalhães, nasceu o primeiro órgão voltado à educação : Ministério da Instrução Pública, Correios e Telégrafos.
Fortaleceu-se a pedagogia tradicional misturando a influência jesuítica com as teorias de Pestalozzi (na educação, a essência é o amor), inclusive com boa dose do Positivismo.
*Foi fundada em Paris, em 1534, pelo espanhol Inácio de Loiola, só oficializada em 1540pelo Papa Paulo III. Nesse mesmo ano alguns membros da nova ordem foram introduzidos em Portugal onde reinava D.João III. Manuel da Nóbrega e outros seis jesuítas acompanharam Tomé de Sousa que partiu de Lisboa em 1/2/1549 e chegou à Bahia só em 29 de março.
 A história da educação superior privada no Brasil começa em 1891 com a Constituição da República, descentralizando o que era exclusivo do poder central, inclusive delegando para os governos estaduais, com efeito imediato pela ampliação e diferenciação do sistema de ensino superior.  Entre 1889 e 1918 foram criadas no país 56 novas instituições de ensino superior, na maioria privadas, de iniciativa confessional. O projeto de uma universidade para o Brasil, então, elaborado por uma elite intelectual, inscrevia-se em um movimento de modernização cultural e educacional, defendendo o ideal de uma universidade pública com a proposta de institucionalização da pesquisa no interior do sistema.
Passadas muitas décadas, sem que hoje as autoridades governamentais de ensino conheçam a fundo a evolução da história educacional do país, o setor privado está diante de transformações orientadas para uma maior diferenciação entre os estabelecimentos que o integram e de uma organização mais segmentada da representação de seus interesses. Por isso a renovação na oferta de cursos, respondendo a demandas heterogêneas, seja da clientela, seja do mercado ocupacional.
Um grande problema da iniciativa privada, senão o maior, e ao que tudo parece insistente, de mandato a mandato, é a crescente e asfixiante subordinação aos controles e trâmites burocráticos que no mais das vezes induzem ao abortamento ou retardamento de projetos institucionais, quando o mercado exige celeridade máxima. E há um sem-número de ações de governo que demonstram a implicância contra a educação privada, quer pelas contradições nos pronunciamentos pela mídia, quer pelas ações regulatórias que só infernizam o setor por meio de esdrúxulas normas constritoras. Sobretudo quando o mercado precisa se mexer e se desenvolver pelas próprias pernas, neste acirrado momento de competitividades. Se nos detivermos em todos os paredões erguidos, sob pretexto dos policy makers, em continuamente inibir investimentos e participação maciça no PIB nacional, pelas desastrosas medidas de engessamento como as MPs que instituíram o calote, por reformas universitárias que se assemelham a lendas ou episódios mitológicos e que num passe de mágica desandam ao sabor de amargo laxante, vamos parar. Precisamos de políticas educacionais e não só de políticas de avaliação.
Não se trata de considerar a iniciativa privada como demônio ou como anjo decretando a ela o destino de Sísifo, porque é o que vem acontecendo, ou ainda, a de transformar o setor educacional na caixa de Pandora.
Vez por todas, é preciso ter presente que condicionantes legais e interesses dos dois atores do sistema – público e privado – somados aos fatores de mercado, podem e devem direcionar o rumo das mudanças, mas nunca de modo inverso a inibi-las. Contudo, elas certamente ocorrerão, e só podem ocorrer, quando haja contrapartida e ajuste de interesses voltados aos objetivos, recíprocos. Ainda que ao ensino superior público o mercado não conste de sua agenda, de seu planejamento.
Os estabelecimentos de ensino superior privado, nas suas perspectivas e iniciativas, não podem depender, com a freqüência atual, do aval do Estado. Ou melhor, dos que dominam a fiscalização e controle do sistema. Um mercado, primariamente, exige inovações, e constantes. E não há lei que se oponha à ocorrência delas em situações competitivas, sobretudo ante a solar e inevitável expansão decorrente da globalização sócio-industrial e da economia.
Por que a imposição de vagas, em turnos específicos, a cotização, as avaliações draconianas, as contumazes críticas ácidas quanto a qualidade, interrupção de autorizações de cursos, estatização de vagas particulares, etc. etc.?
É de se perguntar se as autoridades de governo, voltadas à educação, enxergam a majestade numérica de concluintes nos cursos superiores no Brasil, entre 1980 e 2002 *, de resultados muito expressivos: total de 6.129.388, sendo 4.004.900 na iniciativa privada e 2.124.488 nas três esferas públicas ( federal = 1.079.018, estadual = 725.573 e municipal = 319.897 ). Pelo Estado de São Paulo a marca de concluintes do ensino superior no mesmo período foi de 1.824.073 na iniciativa privada e 357.001 na alçadas públicas ( federais somente 18.237, estaduais = 204.048 e municipais = 134.716 ).
* Adotei o período citado por mostrar relevância numérica nos últimos anos.
É preciso dizer em voz alta que a posição de grandeza do ensino superior privado desde a década de 60, com intensidade e velocidade, ocorreu como resposta à demanda da juventude que aspirava a esse nível de ensino e a do mercado ocupacional sem que, no entanto, o setor público tivesse se voltado para o atendimento de massas. Este ficou exclusivamente para o particular, com suas inerências, inclusive do risco, no nicho da educação massiva superior.
Um volume imenso de vagas não ocupadas estão azedando nas particulares como nas públicas e se isso é indicador de falta de qualidade então contraímos a mesma doença. Mas não é a realidade. Esta transcende aos muros das escolas pois está na economia que não marcha, que não propicia empregabilidade. Assim, o problema não está na escola mas nas políticas monetárias de governo. Por que, então, a investida contra o ensino superior privado ? Faz lembrar a crônica de Stanislaw Ponte Preta, da velhinha que atravessava todo dia a Ponte da Amizade com uma Lambreta. Revistada na fiscalização, nunca portava nenhum contrabando. A materialidade do crime era o próprio biciclo motorizado.
É de se perguntar o que faria o Estado se tivesse que suportar aquela cifra de concluintes das escolas privadas em seu abrigo. Com que recursos ? Aliás, as receitas da União só cresceram, por via de todas as incidências tributárias que asfixiam a iniciativa privada, com destaque no setor. Tirou-se proveito das arrecadações dirigindo expressivas verbas para o setor público educacional superior. Não fosse isso talvez nem educação pública teríamos, por absoluta pobreza do Estado e sua condição de inadimplência, ou melhor, de insolvência. E esta última é a que se verifica com o falido Estado brasileiro. É preciso ter olhos de enxergar.
Não se deseja desregulamentação, ausência de avaliações, facilitismos franciscanos, ouvidos de mercador, os três macacos sensoriais, véus e fumaças mas também não queremos a pecha de vilões e algozes dos mirrados salários familiares. Queremos, isto sim, normatividade estável e perene e não um cipoal de regras desconexas que não respeitam, minimamente, a hierarquia técnica do diploma constitucional. E a regulação é um dos maiores entraves à qualidade, que se assemelha a uma montanha russa asfixiando na descida e tonteando na subida. Queremos o respeito a que temos direito, até porque, somos maioria.
Alguém duvida e discute a expoência tecnológica alcançada pelo Japão ? Por lá a iniciativa privada no ensino responde por 80% das instituições, assumindo a responsabilidade do ensino de massas e tornando possível preservar as universidades públicas, estabelecendo-se funções e atuações complementares, não suplementares, ao mercado mas com um divisor de águas. Ainda que não seja a mesma coisa ter o maior número de matrículas e/ou maior número de estabelecimentos de ensino, registramos alguma semelhança com aquele país.
Mesmo que o Estado seja aquele que detém o poder coercitivo, fiscalizador e controlador do sistema, é preciso ressaltar, entretanto, que são os governos que formulam e implementam políticas na área educacional superior, quando o fazem. Há anos, estamos em quase beligerância com um exército de Brancaleone, espremidos num valo à espera de definições, agudizadas desde janeiro do ano passado.
O setor precisa de uma alforria e não de escravocracia, arrogante, orgulhosa, vaidosa e soberba.
A caixa-preta em que se transformou a regulação do ensino superior só traz inseguranças e perplexidades ao setor que todo santo dia amanhece com desvios e sinuosidades de um serpentário legislativo. É uma enxurrada de portarias, resoluções, decretos, MPs, pareceres normativos herméticos, sem divisarem a carta constitucional.
Ao que tudo indica, a iniciativa privada parece não importar ao governo, tanto que não se preocupa com e por ela, ao contrário, deseja sua fragmentação, debilidade e insucesso como a quem está incomodando. E mais, como sendo o setor privado de ensino superior um desvio indesejado do sistema porém no qual mais de 75% dos universitários recebem sua formação. Esta, quando relacionada diante de cursos e escolas, transcende o mundo acadêmico pois se estreitam aos valores das gerações apoiadas em demandas autênticas.
O apressamento do ensino, via catapulta, de crianças do fundamental e médio, sem adequada formação educativa, tem levado as IES privadas a um sem-número de ações aflitivas, no afã de “resolver essa educação incompleta” dos egressos do médio. Basta uma análise nem tão profunda do grau de semi-alfabetização que lhes é perpetrado, seja por “aprovações automáticas” seja pela incúria do Estado nos primeiros graus da educação.
Motivadas, as críticas não menos ácidas às autoridades governamentais de ensino são abundantes mas em espírito colaborativo a iniciativa privada vem tentando minimizar seus efeitos com verdadeiras UTIs educacionais, tentando aparar arestas numa matéria prima de “carregação”. Algumas delas de grande sucesso, outras nem tanto, deixam as IES privadas nas incômodas condições de cúmplices ou reféns do processo. E mesmo assim atiram pedras querendo nos abater com boleadeiras mortais.
Como entender o fenômeno do descaso e desprezo pelos cursos de formação, as licenciaturas, onde reside o maior número de vagas ociosas no cenário educacional do país ? Está na pouca qualidade atribuída a eles ou a resposta fica mais embaixo, porque se é o Estado que detém a quase exclusividade dessa oferta e não paga salários condizentes, o que esperar ? Ainda que por medida governamental se leve à ocupação de milhares dessas vagas nas IES, nem por isso haverá interesse da juventude, que olha e enxerga além do umbigo. Mostra disso é a oferta que já vem sendo feita pelas IES, espontaneamente, em regime de gratuidade a tais cursos. Não terá êxito, nem por Decreto nem ao modo de convocação para o serviço militar.
O que dizer também da última medida de impedir a abertura de outros cursos de Direito no país com a falácia argumentativa de que existem muitos ou de que os existentes não cumprem o papel ?
A injustiça assoberba na medida em que a análise só localiza o resultado do Exame da OAB sem tecer comentários sobre a qualidade que o ingressante / seletivado carrega para dentro das salas de aula. Desnecessário nos estender quão mínima formação obtiveram no ensino fundamental e médio. Qualquer semi-alfabetizado tem notícias do ENEM. E não é preciso ser jornalista, advogado ou pós-graduado para interpretar o significado e relevância dos resultados. O Estado sim é que deveria abrigá-los em escolas superiores públicas como “herança”, ou punição, de seu próprio trabalho no nível anterior de formação. Mas não, os “lança” para a educação privada como a se “livrar” deles porque propõe vestibulares / seletivos que se afiguram como parede de concreto às públicas, que só permitem ingresso àqueles que obtiveram adequada formação.
Afora isso, o que dizer do corpo docente dos cursos de Direito que dão sustentação como todos os demais ao ensino-aprendizagem ? Não são os professores, na sua maioria, todos operadores do Direito ( Advogados, membros do Ministérios Público e da Magistratura, inclusive Ministros ) dando contribuições pessoais pela dedicação na passagem do conhecimento jurídico-legislativo ?
Quem prepara os alunos dos cursos de Direito não são eles ? Não são capazes ?  Sabidamente, nem todos os graduandos vão a um exame generalista — como o praticado — senão com competências exclusivas a exercer este ou aquele campo do Direito. Assim é em todos os campos do saber, em todas as áreas do conhecimento.
Levar um futuro operador do Direito Trabalhista e se expor a um rigoroso exame no espinhoso campo Penal, antes de ser exame exigente é um crime. Inexiste na atualidade aquela generalidade de atuação mas, ao contrário, por especificidade, por especialidade. O mesmo se pode dizer de quem quer abraçar o campo do Direito Ambiental mas não tem “queda” para o campo do Direito Tributário. Dúvidas à parte, alguns velhos advogados, com bancas promissoras, não conseguem(iriam) responder aos testes.
Estatísticas do MEC/INEP dão conta de que em 2002 nada menos que 600 mil candidatos procuraram pelo vestibular/seletivo aos cursos de Direito no país, numa contenda de 150 mil vagas que foram preenchidas por 120 mil aprovados. Assim, 480 mil não lograram aprovação/ingresso. Isso se chama demanda real. Ademais, falar do que está errado é preleção de mercador, sem a devida sensibilidade interpretativa dos problemas já abordados acima. Não são cursos e vagas em demasia. O que abunda e excede é “falação”, desídia e negligência.  Assim, instala-se a metralhadora crítica disparando impropérios para o segmento educacional privado, sem o descortino de sua imensa contribuição à educação nacional, porque nas últimas décadas o abandono ao ensino público foi realmente total, em todos os níveis.

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