sexta-feira, 17 de abril de 2015

Avaliação Fraudada em Escola dá Cadeia



Prof. Roney Signorini
Assessor e Consultor Educacional
roney.signorini@superig.com.br

Até o final do ciclo do Ensino Fundamental as crianças vivem uma experiência de investimento no processo e a seguir passam para a experiência de investimento no produto, quando se dá uma grande mudança pois de avaliadas passam a examinadas.

Conforme o professor Cipriano Luckesi, “o ato de examinar tem como função a classificação do educando, minimamente, em “aprovado ou reprovado”; no máximo, em uma escala mais ampla de graus, tais como as notas, que variam de 0 (zero) a 10 (dez) ou como é uma escala de conceitos, que pode conter cinco ou mais graus (A a E). Ao ato de examinar não importa que todos os estudantes aprendam com qualidade, mas somente a demonstração e classificação dos que aprenderam e dos que não aprenderam. E isso basta. Deste modo, o ato de examinar está voltado para o passado, na medida em que deseja saber do educando somente o que ele já aprendeu;o que ele não aprendeu não traz nenhum interesse.”

Diversamente, o ato de avaliar tem como função investigar a qualidade dodesempenho dos estudantes, tendo em vista proceder a uma intervenção para a melhoria dos resultados, caso seja necessária. Assim, a avaliação é diagnóstica. Como investigação sobre o desempenho escolar dos estudantes, ela gera um conhecimento sobre o seu estado de aprendizagem e, assim, tanto é importante o que ele aprendeu como o que ele ainda não aprendeu. O que já aprendeu está bem; mas, o que não aprendeu (e necessita de aprender, porque essencial) indica a necessidade da intervenção de reorientação..., até que aprenda.

Alguma coisa que necessita  ser aprendida, como essencial, não pode permanecer não aprendida. Tomar conhecimento somente do que o educando aprendeu não permite investir no processo, porém somente no produto É centrar-se no “tirar nota” e não no “aprender”.
Isto colocado, bem sucintamente para posicionar o leitor do que vem a seguir, ocorrido no EUA, na cidade de Atlanta, é de uma gravidade educacional incomum, atribuindo-se a uma fraude nas notas escolares como o maior escândalo na história da educação americana. Os professores poderão pegar até 20 anos de prisão.

Os 10 professores, algemados nos bancos de réus foram condenados pelo júri por crime organizado quando falsificaram os resultados dos testes dos estudantes. A fraude decorria de interesses pois quanto maior a nota média da escola isso resultava em bonificações. Tudo envolvendo escolas públicas tendo como protagonista do esquema de fraude a própria superintendente de educação da cidade de Atlanta, estado da Geórgia, que escapou do julgamento por ter morrido antes do assunto vir à tona. Não sem antes ter abocanhado US$500 mil como bônus de desempenho/performance, inclusive tendo sido eleita, na época, pela Associação Americana de Administradores de Escolas como a superintendente do ano (2009). E mais, Beverly Hall foi recebida na Casa Branca pelo ministro da Educação por ter conseguido os resultados de 52 mil alunos registrarem médias maiores nos exames de avaliação de desempenho.

Os alunos obtinham notas altas e passavam de ano sem saber as matérias a ponto de uma estudante admitir mal saber ler mas que está perto de se formar no ensino médio.

O iter criminis (caminho do crime) era de muita simplicidade pois a bruxa orientava os professores a apagar com borracha e corrigir as respostas erradas nos testes que avaliam as escolas envolvendo quase 180 funcionários.

O episódio nos remete às avaliações nacionais quando o professor querendo se ver livre dos maus alunos sai distribuindo nota alta como que beneficiando o aluno quando em verdade está condenando-o. O que dizer, então, quanto à aprovação automática.
Avaliação escolar é ato de grande seriedade e exige muita competência.
Professor não pode se prestar a ser refém nem cúmplice de aluno quando se trata de avaliação conteudística.

O que está subjacente à avaliação do educando na escola é o conhecimento disponibilizado pelo educador, portanto, ela se impõe aos dois. É essa constatação que explica o medo instalado hoje nas salas de aula em dias de provas/exames, aterrorizando docente e discente e levando à indagação: para que o conhecimento se ele não é testado e avaliado? Qual a validade do teórico se não é posto em prática?. Imagine-se o conhecimento obtido no início de um curso e que, ao final dele, não terá a menor importância e valor porque ficou velho. Assim será (ou já é?) a sociedade do conhecimento, que interioriza a sociedade avaliativa – ou valoradora, ou avaliadora – sem distinguir, com efeito, onde começa a informação e onde termina o conhecimento.
Eis uma situação típica de imbricação conhecimento/informação, quando o conhecimento passa a ser o maior, o único tesouro e principal bem de consumo, conforme Peter Drucker (o guru do marketing), para quem é imperativa a necessidade de mantê-lo permanentemente atualizado.

Se a informação leva ao conhecimento e se transforma em saber, que se consolida e estratifica pela sua validação/constatação utilitária e consumerista, que papel tem aquele que aprova, avalia, dá certificação e validade ao conhecimento? O próprio detentor do conhecimento, na sua utilização ou não, assim como o avaliador que imprime o seu passed e o utilizador final (sociedade) são os degustadores desse alimento e, portanto, também responsáveis por sua aprovação. Se a sociedade está disposta a abrir mão de qualidade garantida, em qualquer campo da atividade humana, avalizada/avaliada, é direito próprio, mas não do avaliador. A tarefa responsável, portanto, está antes no avaliador, no agente do processo que visará como fim aos resultados. Então, o que é possível verificar sobre avaliação educacional, estabelecendo uma diagnose nos processos cognitivos dos estudantes, na avaliação do aprendizado?
Isso deixa o professor/avaliador em duas situações bastante incômodas: a de refém ou de cúmplice do aluno. A avaliação responsável e isenta do avaliador, com ele próprio, com o aluno e com a sociedade, não se permite dúvidas e fragilidades. Avaliação equivocada ocorre porque o conhecimento proposto era um equívoco, de forma e conteúdo, e suspeito é o avaliador que se coloca ambiguamente, ao desdém do que deve(ia) ser ensinado porque precisa ser aprendido. Não é mais possível o uso do velho clichê "o aluno será capaz de..." e completar a frase com qualquer verbo no infinitivo. Pode ser o coração, mas não é a alma do que deve estar contido nos objetivos e justificativa da disciplina. Sabendo que o ensino e o aprendizado devem ser conduzidos para estimular, provocar no educando uma consciência de construção, interatividade e crítica, visando descobrir e mergulhar em habilidades e competências pessoais, que conduzam a alguma capacitação, o educador sempre levará em conta os resultados impostos e a se obter do processo, ou nas palavras de T. Kellaghan, “a busca por resultados responsáveis .

Aplicação, essa é a palavra do momento no ensino, aliás, a volta dela. A agenda reformista da educação é sempre dominada pelos modismos, por algum tempo. É preciso, a qualquer custo, ampliar o potencial de uso e aperfeiçoamento das capacidades de avaliação dos professores com relação aos alunos. Nisso reside, no mínimo, o acerto da escolha. Não deve ser a busca da aprovação na “coitadice” nem a reprovação na “vitimez” do avaliado.

O emprego adequado de um "molde de avaliação" , sem extremos e exageros, torna-se um facilitador nessa tarefa tão difícil. Afora poder colocar em sacrifício absoluto o futuro de um jovem, sobretudo o que está em desencanto com o ambiente atual e dele foge, se rebela e se angustia pela aparente falta de perspectivas socioprofissionais. Essa moldura, entretanto, não é fórmula, padrão ou gabarito estabelecido. É antes um método pessoal, pelas singularidades do avaliador e do avaliado. Deve-se caracterizar como ato de neutralidade, sem a rixa ou acidez inquisitória. Não deve mostrar-se como esgrima rancorosa, desafiadora de quem, não obtendo resposta satisfatória, desabafe "...eu sabia que você não sabia" ou "...tinha certeza de que você não responderia".
As habilidades e competências, hoje na moda, podem dar sinais indicativos apropriados na elaboração de um momento de avaliação. Por conseqüência, na construção de uma vida profissional mais realizada. Adequada às aspirações pessoais, grandes ou pequenas porém autênticas. Desse modo, aqueles objetivos da disciplina têm de ser repensados, refeitos para outras realidades e dimensões: a das competências e habilidades. Não é tarefa simples para quem não está inserido nos mercados e desconhece perfis.
A juventude atual tem forte razão para a recusa em ser avaliada, de fora para dentro, à moda antiga. É simples, certo ou errado, possível ou não. O jovem admite ser avaliado, porém, de dentro para fora. Não admite ser questionado pelo avaliador sobre o que ele não sabe, mas deveria saber, e o avaliador insiste em saber o que ele não sabe. Será que o avaliador não sabe que não adianta querer saber o que o avaliado não sabe? A questão central é por que o aluno não sabe ? Por incrível, a resposta todos sabemos.

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