Sabedoria infantil narrada por Dom Lucas Moreira Neves, Jornal do Brasil, jan. 1997
Não boto a mão no fogo pela autenticidade da história que
estou para contar. Não posso, porém, duvidar da veracidade da pessoa de quem a
escutei e, por isso, tenho-a como verdadeira. Salva-me, de qualquer modo, o
provérbio italiano: "Se não é verdadeira... é muito graciosa!"
Estava, pois, aquele pai carioca, engenheiro de profissão,
posto em sossego, admitido que, para um engenheiro, é sossego andar mergulhado
em cálculos de estrutura. Ao lado, o filho, de 7 ou 8 anos, não cessava de
atormentá-lo com perguntas de todo jaez, tentando conquistar um companheiro de
lazer.
A ideia mais luminosa que ocorreu ao pai, depois de dez a
quinze convites a ficar quieto e a deixá-lo trabalhar, foi a de pôr nas mãos do
moleque um belo quebra-cabeça trazido da última viagem à Europa. "Vá
brincando enquanto eu termino esta conta", sentencia entre dentes,
prelibando pelo menos uma hora, hora e meia de trégua. O peralta não levará
menos do que isso para armar o mapa do mundo com os cinco continentes,
arquipélagos, mares e oceanos, comemora o pai-engenheiro.
Quem foi que disse hora e meia? Dez minutos depois, dez
minutos cravados, e o menino já o puxava triunfante: "Pai, vem ver!"
No chão, completinho, sem defeito, o mapa do mundo.
Como fez, como não fez? Em menos de uma hora era
impossível. O próprio herói deu a chave da proeza: "Pai, vocë não percebeu
que, atrás do mundo, o quebra-cabeça tinha um homem? Era mais fácil. E quando
eu arrumei o homem, o mundo ficou arrumado!"
"Mas esse garoto é um sábio!", sobressaltei,
ouvindo a palavra final. Nunca ouvi verdade tão cristalina: "Basta arrumar
o homem (tão desarrumado quase sempre) e o mundo fica arrumado!".
Arrumar o homem é a tarefa das tarefas, se é que se quer
arrumar o mundo.
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