Fracassei em tudo o
que tentei na vida. Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não
consegui.Tentei salvar os índios, não consegui. Tentei fazer uma universidade
séria e fracassei. Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e
fracassei. Mas os fracassos são minhas vitórias.
Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu.
Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu.
Darcy Ribeiro (1922-1997)
Prof. Roney
Signorini
Assessor e Consultor Educacional
Assessor e Consultor Educacional
signorinironey1@gmail.com
Em 1982, numa conferência, Darcy Ribeiro profetizou: “Se os
governantes não construírem escolas, em 20 anos faltará dinheiro para construir
presídios”. Ele não só tinha razão, como também o país atravessa uma crise no
sistema prisional sem precedentes, com 622 mil presos e um déficit de 250 mil
vagas.
Na virada do ano, escancarou-se o horror bestial (de que o
cidadão comum e “de bem” nunca desconfiou): chacinas entre facções do crime
organizado, que começaram no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), em
Manaus, espalharam-se como metástase por vários outros presídios. E chacina com
requintes de crueldade, uma explosão de barbárie, com presos decapitados,
desmembrados, incinerados.
As fotos devassam a intimidade dos presídios e o caos do
sistema prisional. Superlotação das celas imundas infestadas de ratos e baratas
(qualquer semelhança com masmorras medievais não é mera coincidência), com
presos amontoados como animais à espera da degola. Surgimento de favelas –
dentro dos presídios! –, com conhecimento dos agentes carcerários e diretores. Presos
com armas de grosso calibre e facões (ambos não são de fabricação “caseira”.
Pergunta-se: como estão lá?). Presos desocupados pelos pátios.
Tudo isso ao lado de outras fotos que mostram algumas celas “vip” para quem manda realmente no presídio: os “xerifes”, que dão ordens de massacre e, de dentro das prisões, comandam as ações das facções aqui fora.
Tudo isso ao lado de outras fotos que mostram algumas celas “vip” para quem manda realmente no presídio: os “xerifes”, que dão ordens de massacre e, de dentro das prisões, comandam as ações das facções aqui fora.
A radiografia da população carcerária é previsível: 56% têm entre 18 e 29 anos; 67% são negros; 93% são homens; 53% não concluíram o ensino fundamental.
Dados do último Levantamento Nacional de Informações
Penitenciárias (Infopen), do Ministério da Justiça preveem que, se o
crescimento da população carcerária mantiver o ritmo, em 2022 o Brasil superará
a marca de 1 milhão de detentos. Segundo a presidente do Supremo Tribunal
Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, também presidente do Conselho Nacional de
Justiça, um preso custa ao Estado 13
vezes mais (!) que um estudante: em média, R$ 2,4 mil por mês (R$ 28,8 mil
por ano), enquanto um estudante de ensino médio custa atualmente R$ 2,2 mil por
ano.
“Investimento em educação, de fato, reduz a vulnerabilidade das pessoas, que ficam menos expostas ao crime. É pacificado na literatura, um fato científico”, afirma o pesquisador Rafael Alcadipani, professor da Fundação Getulio Vargas e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. “Mas precisamos ir além desse mantra: temos que exigir qualidade no ensino e menos desigualdade. Países com menos desigualdade geram um povo educado e, consequentemente, menos violento.”
Já em 2013, um estudo do departamento de Economia, Administração e Sociologia da Universidade de São Paulo (USP) mostrou que para cada investimento de 1% em educação, 0,1% do índice de criminalidade era reduzido. Para obter esse número, a pesquisa analisou o gasto público em educação entre 2000 e 2009, e como o investimento impactou na redução da taxa de homicídios. Depois, observou como uma escola voltada para o desenvolvimento de conhecimento tem menos chance de desenvolver alunos violentos do que escolas com traços como depredação do patrimônio, atuação de gangues e tráficos de drogas.
A escola é um meio de transformação. Mas a boa escola: com professores valorizados, bem formados, para que crianças possam sonhar com um futuro que não seja miserável. “Estamos falando de adolescentes e jovens que moram nas periferias, lugares mais vulneráveis. Os dados mostram que a escolaridade na população carcerária é baixa e a realidade nos mostra que se houvesse escolas de qualidade, de fato, eles poderiam ter um futuro diferente”, garante a psicóloga Vanessa Barros, professora do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de Minas Gerais e integrante do Observatório Nacional do Sistema Prisional.
Na mesma revista Veja, de 11 de janeiro, que estampa as fotos da barbárie carcerária, a reportagem “O fausto da senhora Cunha”, como um bofetão na nossa cara, reproduz trechos de conversas no Whatsapp de Cláudia Cruz com amigas: “Nesse momento estou gastando uma grana no f mall! Hahahahah”; “Acabo de comprar a bobo [Bo.BÔ, grife de roupas de luxo] inteira! Rsss”; “To enchendo a barriga em portugal [com p minúsculo mesmo]! Bacalhau saindo pelas orelhas.” Outra reportagem da mesma edição (“Deboche aéreo do governador”) revela que, enquanto Minas Gerais enfrenta calamidade financeira e atrasa salários, Fernando Pimentel [governador de Minas] usa helicóptero do governo para buscar o filho numa festa de ano-novo, coisa que Renan Calheiros, Aécio Neves e Clóvis Carvalho [ministro de FHC em 1999] são useiros e vezeiros em praticar. Ah! E Sérgio Cabral também.
Este, aliás, também, tem uma “patroa” de fazer inveja a muita mulher, quem sabe até a Imelda Marcos tupiniquim, dos milhares de sapatos: joias, roupas, sapatos, restaurantes, viagens... Tudo às nossas expensas!
Eduardo Cunha e Sérgio Cabral estão presos (assim como tantos outros corruptos e corruptores denunciados pela Operação Lava-Jato). As somas conseguidas ilicitamente por todos eles são astronômicas e dariam para, no mínimo, amenizar a crise econômica por que passa o país. Por baixo, pó baixo, construir uma dezena de presídios de primeira classe. Mas, como canta Gal Costa: “Onde está o dinheiro?/ O gato comeu, o gato comeu/ E ninguém viu/ O gato fugiu, o gato fugiu/ O seu paradeiro/ Está no estrangeiro/ Onde está o dinheiro?”.
Toda essa gente frequentou boas escolas, não nasceu em periferia nem morou em favelas, mas, talvez, lhes tenha faltado a escola voltada para o desenvolvimento do conhecimento, do respeito, da ética, da solidariedade, da civilidade e da cidadania, que, acredito, é a única forma de educação que liberta e abre caminhos para se enfrentar, e transformar criativamente, a realidade.
Enquanto esse circo dos horrores, sem picadeiro, domina e hipnotiza plateias, duas outras notícias trazidas pela mídia exacerbam em bons exemplos: em Pernambuco, Sebastião Pereira Duque, 72 anos, catador de lixo, dá exemplo de solidariedade ao construir uma escola para 75 crianças. E não é só isso porque também constrói barracos para quem não tem onde morar, e não é de hoje, isso há 24 anos puxando uma carroça pelas ruas de Olinda. A escola, Nova Esperança mexe com os brios de muitos brasileiros, inclusive com mantenedores de escolas, do Fundamental ao Superior.
Com a picardia que lhe é própria, o jornalista Elio Gaspari, no último dia 15, afirma que o Brasil dá certo ao trazer a notícia de que seis jovens do ensino médio do Rio de Janeiro mergulharam no crowdfunding [a popular vaquinha social] para arrecadar fundos (no mínimo R$ 44 mil para custear as viagens), já que eles foram aceitos para representar o Brasil no torneio de matemática da Universidade de Harvard e do Massachussetts Institute of Technology (MIT), mas nem por isso o Estado lhes deu guarida, ninguém do município, estado ou união moveu palha para que representassem o Brasil no certame, que reúne centenas de estudantes de todo o mundo. Em outras oportunidades, nos últimos seis anos, eles já conquistaram mais de cem medalhas em matemática, física, astronomia e robótica. O extraordinário é que já conseguiram R$ 100 mil.
Que espetáculo, mas também que vergonha de parte das autoridades educacionais.
Encerrando o comentário, Gaspari diz que numa época de “acidentes pavorosos” (Temer, se referindo à carnificina nas prisões) enfim uma iniciativa maravilhosa aquela, claro.
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